sábado, 4 de fevereiro de 2012

1997

Folhas caladas
pela dignidade silenciosa
ostentam o seu retrato
despidas de adornos.
Conhecem as muitas faces
de alguém sem rosto.
Conhecem os desejos
que confluem para a anulação.
Fecha os meus segredos
nas tuas páginas de cumplicidade.
E, esquecida, deixa-me morrer.
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Alguma coisa quebrou-se
foi por vezes os sonhos semeados
Falsa ilusão da vontade
Verdadeiro suicídio.
Apanho os cacos
e a reconstrução machuca.
Restaurações inusitadas.
A relatividade me confunde.
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As rosas exalam seu cheiro sensual
e eu,só consigo sentir-me  mal
diante da lancinante exasperação
da natureza do outro.
Não correspondo e assisto passiva
a um filme em que me falta a fala.
Não quero papéis decorados.
Quero o improviso das tramas proibidas.
Polêmico por ser diferente,
voraz por ser verdadeiro.
E as rosas ornamentarão secundárias
a excelência dessa atuação.
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Passado pesado,
pedra parada
sobre os corpos incorporados
nas paredes dos  séculos.
Meus braços te impelem,
deixo vazar o sangue
petrificado pelo susto de viver.
És pó,
eu pedra.
Nosso destino é disfarçar
e pesar sobre o mundo.
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 Obstinação
Perpassa o cansaço e alcança o dia
O dia antes cobiçado.
Se a noite transforma os desejos,
o dia dilacera a intenção.
E foge o que gemia e germinava
e permanece o que destrói a confissão.
A metamorfose se completa
em oposições e vacila
frente ao espelho do real.
Mas a sombra esconde
e a satisfação ultrapassa a obediência.
O que te pertence, mantem-se secreto.
Brilha luminoso, o que, no dia
sufocante e áspero,
se reprova.




sábado, 16 de abril de 2011

Amar o próximo

Penso, pelos últimos acontecimentos vistos na mídia, que o ser humano, diferente de outras espécies, é o único ser que não se contenta apenas com a sua vida. Quer a vida dos outros. E isso pode ser discorrido nos mais diferentes sentidos: o outro tem que pensar nele ( afeto, afeição); aquilo que o outro possui ou a forma como vive ( modelo idealizado); a opinião do outro ( aceitação) e até a vida propriamente dita: você não me vê, então te mato. Você me vê de uma maneira que não gosto, eu te mato também. E essa morte deixou de ser metafórica, é agora uma maneira de discordar, de se mostrar ou de ter aquilo que se pensa ter direito. Tudo na marra. “ Amar o próximo como a si mesmo”... Acho que ninguém mais ama a si mesmo o suficiente, pois o coitado do próximo está tão carente e desesperado, que nem seu amor próprio o salva. Talvez se estivéssemos em dia com o nosso amor próprio não precisássemos pagar um preço tão alto aos olhares, cuidados e opiniões alheios. Não nos arriscaríamos tanto em iniciativas infrutíferas e não estaríamos preocupados em ser um modelo de contestação ou de aceitação para preencher as expectativas que não são nossas. E acredito, não precisaríamos ser notados a qualquer preço. Não podemos dar o que nos falta, só aquilo que nos sobra pode ser oferecido. E por aquilo que presenciamos à nossa volta, o que há a ofertar é agressividade. Uma violência que parece já vir de berço. Uma violência que excede, transborda e atinge todos os próximos e os distantes também. Uma doação massiva daquilo que está latente em grande parte das pessoas e que só espera a hora de vir à tona. E a justificativa é: o próximo não Fez a sua parte, e eu não fiz a minha – amarmos a nós mesmos o suficiente.

domingo, 3 de abril de 2011

Matemática

MATEMÁTICA

Um homem, que redondamente rodava a vida na pressa para acompanhar o rodar do relógio, sabia que a roda do carro o levaria mais depressa ao centro da cidade, para ele, o centro da vida. Fazia aquele trajeto com freqüência, e naquele dia não poderia rolar a bola com o gordo filho, que de tanto necessitar do tempo do pai, chamava a atenção pela aparência, engolindo redondamente tudo que encontrava pela frente.
O veloz homem não tinha tempo para pensar no tempo. Precisava viver, antes que outro chegasse primeiro ao destino que era seu. Dizer viver é dizer a verdade, pois o que ele menos fazia era viver. Para melhor dizer, ele era vivido pela vida. Vida de correria, na busca apressada de coisas a acumular.
Ele desejava continuar sendo o senhor de um amontoado de tijolos que formavam vários quadrados e, dentro dos quadrados, objetos: redondos, quadrados, triangulares dos mais distintos materiais, todos sólidos, feitos para atingirem a eternidade da insatisfação.
Era necessário dar Educação ao filho. Para isso pagava uma gorda quantia a outro amontoado de tijolos que cuidava do futuro dos homens. Tal instituição apresentava-se sob o nome de Carpe Die, e era capaz de transformar a vida das pessoas.
Mas ele era um homem respeitado. Um exemplo de como se adquire respeito entre os homens. Era responsável.
A úlcera que combatia há anos era responsabilidade sua, a obesidade do filho, a competição desenfreada, um possível infarto também.
Sua gravata era o status para vencer o relógio. Ele queria encontrar o futuro. Quando o futuro chegasse, tudo seria diferente. Ele seria um homem realizado e feliz. E, por isso, corria mais. Para garantir o futuro. Com ele, corriam as horas, os dias, os meses, os anos e as outras pessoas. Todos passavam apressados como um vendaval. Todos desejavam uma oportunidade de encontrar o futuro.
Pois naquele dia, no centro da cidade, nosso amigo ainda não conhecia o seu futuro. E o tempo, nosso dono absoluto, se apresentou. Sentia girar a cabeça, igual ao seu relógio. Numa vertigem, ergueu o rosto e, entre os altos edifícios, conseguiu avistar o céu. Não o céu que conhecia pela previsão meteorológica, e sim, o céu da contemplação: um céu límpido. Bucólico, não? Não, triste, pois a todos espera uma figura geométrica retangular. E o futuro computa apenas menos um, questão de matemática.

domingo, 13 de março de 2011

Profissão....professor


PROFESSOR: QUE PROFISSÃO É ESSA?



É  interessante observar a dinâmica da vida profissional de professores, pela multiplicidade de atribuições que dia após dia são agregadas à rotina e minam o trabalho docente.
Claro, não se pode generalizar. Falo a partir de vivências  como professora e observações ao longo desse exercício, e me pergunto: Qual o status profissional do professor? Qual seu papel na escola?
 Em treze (13) anos de magistério, já assisti  e vivenciei muita coisa, mas acredito não ter visto tudo.
Comecemos pela relação hierárquica dentro da escola, o que é algo bastante pitoresco. Não  é surpresa para ninguém  que tal relação se dá verticalmente e à  moda antiga. Contestações e críticas são mal vistas, o que é triste se  pensamos em profissionais formadores de opinião. A partir de tal posicionamento, passa-se a  ser  Persona  non Grata. Isso se não ocorrer  registro em ata, de redação duvidosa e tendenciosa. Uma prática bastante comum.
Muitas escolas  trabalham com uma espécie de  corporativismo, no qual integrantes protegem-se mutuamente sem interesse na veracidade de fatos, e os favorecimentos internos integram o quadro funcional.
Desempenhar bem  as funções dentro da área de formação, estudar, informar-se, trabalhar junto a alunos no intuito de exercer a profissão escolhida. Esse deveria ser o papel do professor na escola. Mas, concomitantemente à essa função, somam-se certas “obrigações”, as quais não constam nos currículos de graduação.
Tais propostas dizem da arrecadação de fundos para os caixas escolares, por exemplo. Rifas intermináveis, que ano a ano são realizadas, as quais professores devem distribuir e  recolher, senão comprar.
Pergunto: Manter a escola não é papel da mantenedora?
Claro que para se rifar algo é necessário obtê-lo. Então, listas de doações, principalmente na Páscoa, são elaboradas para ver com que cada professor contribuirá.
Pergunto: Eu não trabalho na escola (como qualquer profissional) para ganhar meu salário? Se tiver que fazer doações, isso não deveria ser uma iniciativa pessoal?
A  arrecadação de brindes junto a empresas para as Festas Juninas é outro dos múltiplos trabalhos de professor. Evidente que ele poderá delegá-lo aos estudantes.
Há anos atrás até flúor na boca dos alunos os professores, de todas as áreas, colocavam. Algo bastante constrangedor, pelo menos para mim, e para alguns alunos que se recusavam a deixar.
            Todas essas colocações são menores diante das interferências que pessoas não habilitadas tentam impor a nosso trabalho pedagógico. E não são poucas.
            A burocracia, como  em todos os órgãos existentes no país, toma conta das atividades mais elementares. Não se resolve nada sem antes passar por meia dúzia de setores. Mas o que se gasta de tempo e papel...           Tudo isso me leva à conclusão que há pessoas que não têm o que fazer e, por isso, o preenchimento de tantos formulários.
            Será que atribuições de menor valor não estão comprometendo o verdadeiro trabalho pedagógico?
Em determinadas datas, o professor  deve se transformar numa “usina de idéias”  para a realização de “eventos” e “festejos” que se repetem todos os anos, já não se sabe o motivo. Ora, essa! Professor ou promotor de eventos? Que história é essa de escola show?  Todos na escola. A pergunta é : Fazendo o quê?
Não basta estar nos limites da escola para ser um estudante, assim como não basta freqüentar aulas em que pouco importa o que está sendo ensinado. É preciso consciência da complexidade dos processos. E isso demanda tempo, tempo que é desperdiçado com atividades superficiais e infrutíferas.
E não me venham falar em socialização, pois os analfabetos funcionais estão aí,  prova  do insucesso da escola,  mas todos socializados.
              Será que tudo isso não acontece  em detrimento do aprendizado do aluno? Se pensarmos no tempo e esforço consumidos em  tais tarefas, fica evidente que sim.
Na verdade, a confusão em torno das atribuições profissionais do professor - em parte pela falta de posicionamento crítico da categoria, em parte pelo oportunismo que emana dos mais diversos segmentos -  transformam o profissional do magistério numa espécie de “faz tudo”nas escolas. Afinal, sempre foi assim, dizem uns. E quando iremos tornar o magistério uma profissão de verdade? Esse parentesco com o sacerdócio não  tem mais cabimento  nos dias atuais.
  E por isso não estranho quando vejo alguma colega limpando a sala para torná-la mais agradável para se estar, espécie de prolongamento do seu lar, resignação ancestral e passividade. Passividade  bem-vinda para o comodismo de  alguns. E assim caminha o magistério, cheio de novas e modernas teorias libertadoras e libertárias.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Minhas poesias

AS lágrimas pouco a pouco
cristalizadas em sulcos pela face
expõem os cadáveres das dores
De antemão, não soubemos ser
e ainda precisamos demonstrar o contrário.
O tempo nos alcança
antes de darmos passos firmes.
E nas cicatrizes,
o caminho da difícil aprendizagem
ampulheta da fugacidade das certezas. ( Bianca Ab)

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

"mulher no palco" - Lya Luft

Abro a gaveta e salta uma palavra:
dança sedutora sobre o meu cansaço,
veste-se de indefinições, retorce-se
no labirinto dass ambiguidades.
Tento uma geometria que a contenha
no espaço entre dois silêncios quaisquer.
Masela inventa o que faço: peso de fruta
no sono da semente, assiste à minha luta,
belo enigma. Eu, mediação incompetente.